VENDA DA BRASKEM PROVOCA RECEIO ENTRE 1,4 MIL EMPRESAS NO RS
Companhias da área de plástico e borracha temem que preços aplicados pela LyondellBasell sejam maiores do que os atuais
A possível venda do controle da Braskem para a holandesa LyondellBasell inquieta dois segmentos que, no Estado, somam mais de 1,4 mil empresas e empregam 37 mil pessoas. A principal preocupação das indústrias de produtos plásticos e de borracha é com a política de preços que pode vir a ser adotada pela Braskem, que domina o mercado brasileiro. O receio das clientes é de que, a partir de novas orientações vindas do comando do Exterior, a relação comercial, considerada boa, se deteriore.
Especulada desde o ano passado, a negociação foi confirmada no dia 15, quando a Odebrecht informou ter tratativas para vender a sua participação de 50,1% das ações ordinárias (com direito a voto) e 38,3% do capital total, o que daria o controle ao grupo holandês. Se a transação for confirmada, estará nascendo a maior fabricante mundial de resinas plásticas.
O presidente do Sindicato das Indústrias de Material Plástico do Rio Grande do Sul (Sinplast), Edilson Deitos, sustenta que a LyondellBasell tem histórico de atuação agressiva. Com isso, teme que, com a mudança de um monopólio nacional para internacional, as empresas que usam as resinas produzidas pelas Braskem tenham os seus custos elevados, percam vantagens e competitividade.
— A indústria de transformação está apreensiva e gostaria de ouvir as propostas da compradora para o setor — diz Deitos, à frente da entidade que representa 1,2 mil empresas no Estado, com 27 mil trabalhadores diretos.
Hoje, a política de preços da Braskem prevê reajustes mensais, a partir de indicadores que podem ser acompanhados, como petróleo e câmbio. A preocupação é com uma mudança de critérios e o fim de benefícios como as vantagens concedidas pela própria Braskem, como a aquisição de matéria-prima mais barata para itens de plástico que são exportados. Além disso, lembra ele, apesar de ser monopolista, a empresa pratica valores semelhantes ao mercado internacional e, por isso, não há necessidade de recorrer à importação de insumos produzidos pela Braskem, como polietilenos (utilizados na produção de filmes, embalagens e sacolas, por exemplo), polipropilenos (usados em brinquedos e recipientes para remédios, entre outros) e PVC (tubos e construção civil).
O setor, por meio da Abiplast, promete reagir para evitar prejuízos. Em uma das frentes, pretende pleitear ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e ao Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços ao menos redução da tarifa de importação de algumas matérias-primas para elevar a competição e questionar os benefícios que a Braskem conquistou em processos de antidumping (contra concorrência considerada desleal de outros países) para produtos como PVC, polipropileno e PET.
Pelos cálculos de Deitos, a Braskem representa hoje cerca de 70% a produção nacional de resinas, mas monopoliza as mais usadas — polietileno, polipropileno e PVC. As principais concorrentes são a Dow — que traz da Argentina e tem os benefícios ligados ao Mercosul —, a ExxonMobil e eventuais importadores.
No Sindicato das Indústrias de Artefatos de Borracha do Rio Grande do Sul (Sinborsul), a preocupação é semelhante. O presidente da entidade, Gilberto Brocco, diz que, hoje, os contratos de reajuste de matérias-primas entre Braskem e as empresas do setor são mensais ou trimestrais. Se a empresa parar nas mãos da gigante holandesa, é difícil saber que política de preços virá, afirma Brocco. Até agora, observa o dirigente, o relacionamento com os executivos da petroquímica é bom, até mesmo em entidades da indústria que têm a participação dos dois setores.
— Em um primeiro momento, não vemos esse negócio com bons olhos. Estamos bastante apreensivos. O receio é de que essa empresa, com o monopólio do mercado, faça o que bem entenda — avalia Brocco, que preside uma entidade com cerca de 230 empresas, que geram 10,5 mil postos de trabalho.
Especialista no setor petroquímico, o consultor João Luiz Zuñeda, da Maxiquim, não vê razão para tanto receio. Mesmo que alguma política da Braskem possa mudar, haverá espaço para negociação e, se for o caso, comprar de concorrentes, ou até mesmo importar. A aproximação com os clientes será natural, entende Zuñeda.
— Me parece mais um saudosismo por ser outra empresa brasileira vendida para um grupo internacional. Mas a petroquímica é um setor de empresas globais, como a Braskem e a própria LyondellBasell — diz o especialista.
Para Zuñeda, não há risco de o polo petroquímico do Sul perder importância com o novo dono. Além de Triunfo ser uma das principais bases de produção da Braskem, estão na cidade gaúcha pontos nevrálgicos como a produção do chamado plástico verde, feito a partir de cana-de-açúcar, e um centro tecnológico que rivaliza em importância com o que a empresa montou nos Estados Unidos.
Procurada por ZH, a Braskem disse que não se manifestaria sobre o assunto neste momento.
O peso da Braskem e da petroquímica
-Sediar o polo petroquímico faz de Triunfo um dos municípios com maior PIB do Estado. Conforme o último cálculo da extinta Fundação de Economia e Estatística (FEE), para 2015, a cidade tinha a oitava maior economia do Estado (R$ 7,47 bilhões), o equivalente a 2% da riqueza do Rio Grande do Sul, apesar de ter apenas a 78ª maior população (28 mil habitantes), conforme o IBGE. Apenas a Braskem gerou, ano passado, R$ 650 milhões em ICMS para o Estado. O faturamento das unidades da Braskem em Triunfo em 2017 foi estimado em R$ 13,5 bilhões.
Quem é quem
Braskem: maior petroquímica da América Latina, tem 41 unidades industriais em quatro países e receita líquida de vendas de R$ 49,26 bilhões em 2017.
LyondellBasell: com sede na Holanda, a LyondellBasell teve no ano passado receita de US$ 34 bilhões, o equivalente hoje a cerca de R$ 126 bilhões. É resultado da compra da americana Lyondell pela europeia Basell, em 2007. Tem 55 unidades em 17 países.
A nova empresa:
Seria a maior produtora mundial de resinas plásticas, com capacidade para produzir 18 milhões de toneladas de polietileno e polipropileno.
Como fica a Petrobras:
A estatal tem outros 47% dos papéis ordinários e 36,1% do capital total. Caso a transação seja concretizada, será garantida à Petrobras a possibilidade de vender a sua parte pelas mesmas condições negociadas com a Odebrecht.
Entenda a cadeia petroquímica e o polo de Triunfo
1ª geração
Braskem: Unidade de petroquímicos básicos do polo. Recebe nafta (derivado de petróleo) e transforma em produtos como eteno, propeno, butadieno, tolueno e benzeno, entre outros, vendidos para as empresas de segunda geração petroquímica, que também ficam no polo.
2ª geração
-Hoje são quatro empresas na chamada segunda geração petroquímica, que transformam os petroquímicos básicos em outro produtos como polietileno, polipropileno, borracha sintética, estireno e poliestireno.
Braskem: as unidades de poliefinas produzem polietilenos e polipropilenos. A empresa tem uma planta que faz eteno verde a partir de etanol (feito com cana-de-açúcar), matéria-prima que vem de outros Estados. O polietileno verde é produzido na planta convencional.
Innova: pertence ao bilionário gaúcho Lirio Parisotto. Produz estireno e poliestireno, aplicados em construção civil, isolamento térmico, brinquedos e embalagens.
Arlanxeo: produz borrachas sintéticas, utilizadas na produção de pneus e aplicações nas indústrias eletrônicas, de calçados, automotiva. Com duas unidades no polo, empresa é resultado de associação entre a alemã Lanxess e a Saudi Aramco, maior petrolífera do mundo, da Arábia Saudita.
Oxiteno: braço do grupo Ultra, que é dono da rede de postos Ipiranga. Produz óxido de eteno, empregado em cosméticos, detergentes, agroquímicos e embalagens.
3ª geração
-Empresas que são clientes das indústrias de segunda geração do polo. Dos segmentos de plástico e borracha, fabricam produtos finais, como embalagens, filmes, pneus, tubos e peças.
FONTE: ClicRBS